A vida é incontornável e os
destinos nascem e crescem ora sob a luz, ora sob as trevas. Renascem
diariamente. São senhores da nossa vontade. Clamam por vida, esbarram em
nossos sonhos. Singram no mar. Quando um avião levanta voo, cortando as moléculas de
ar, levam os destinos para qualquer lugar entre a solidão e a esperança.
A esperança de um novo melhor, embora não sabemos, com
exatidão, o que isso significa.
Partimos e chegamos, talvez para saciar a fome que nos toma, talvez
para movimentar a engrenagem interna, que exige movimentos contínuos. O avião ainda levanta voo, o trem ganha os trilhos, enquanto centenas de destinos seguem seus rumos.
Outros tantos ficam. No coração as linhas se cruzam, formando vórtices, que a cada partida intensificam as marcas, impossíveis de alcançar, pois não as conhecemos. A cada passo adiante, os olhos buscam
pela janela um explicação dessa desconexão, que soterrará o presente,
já então escombros. Chega um tempo em que, por mais que tentamos evitar,
as nossas prioridades mudam, ganham outras formas e lugares. Efeito de
uma memória traiçoeira, que aos poucos se diluí para ceder lugar ao
outrora inesperado.
A irreversibilidade da memória maltrata. Ter a consciência de que o
novo sucumbirá o antigo, que as luzes também se apagam e, sem, muitas
vezes, darmo-nos conta disso, reinventamos na ausência, cujo substrato a
cada dia desaparece, para dar lugar ao que a vida nos obriga a aceitar.
E quando se vê, as convulsões do mundo nos engolem, deliberadamente, para o futuro irremediável.