29 de out. de 2009

Ora iê iê ô...

Ana Teles

Tive uma infância como qualquer garoto. Subia em árvores, soltava pipa, criava peixe como se fosse gente. Gostava de andar com os pés descalços e correr na rua até a hora da minha mãe gritar e me pedir pra tomar banho. A vida lá, com pitangas e jabuticabas, não era melhor nem pior que a de hoje. É bem verdade que muita coisa mudou. A cidade, de poucos mil habitantes para uma com milhões de pessoas, sem contar o ambiente, objetivos e responsabilidades. Mas quando pude, não hesitei em me mudar, pois sou movido por transformações e por mais que doam, acredito que é esse o nosso destino. Alguns fatos nos entristecem, mas nunca duram muito tempo. Machucam e depois vão abrandando. Gosto de dizer que a vida tem movimento próprio e o que era dor e saudade se restringe a um amontoado de lembranças e objetos.
E aqui vou construindo mais uma parte da minha vida, com amigos, amores e minhas atividades diárias. Vou sabendo que não há nenhuma segurança no caminho, nenhum porto ou salvador existe, e que a vida da gente ora é consolo ora é agonia e medo. Sigo meus dias confiando que amanhã seja um dia melhor, onde com amor eu possa fazer minhas descobertas e mudar de rumo quando for preciso. A estrela mais linda, hein? Tá no Gantois. E o sol mais brilhante, hein? Tá no Gantois. A beleza do mundo, hein? Tá no Gantois. E a mão da doçura, hein? Tá no Gantois. O consolo da gente, hein? Tá no Gantois, cantaria Maria Bethânia.

26 de out. de 2009

Felicidade


- Não. Não. A felicidade não é simples. Não há receita: seja feliz em uma semana. Não adianta buscá-la. Ela é bem sem destino, sem origem, sem cria. Mora nas reticências. Quando não vaza pelos cantos, transborda. Sim, felicidade é excesso de alegria. Não, alegria é falta de dor, dor miúda. Felicidade é forma. Deforma a felicidade e inventa. É como arte. Não. É a própria arte. Tem vida própria. Um soneto. Um caminho. Caminho de que meu Deus? Esqueça caminho. Esqueça de deus. É volta, curva, travessia. É atravessar o mundo, cortá-lo ao meio. Não, é coragem. Sim, é morte. Não é fuga. Sim, é abandonar-se.

Cada vez mais acredito que a felicidade é arrancar um punhado de nuvens do estômago e soprar...

11 de out. de 2009

God!

Napalm por Banksy

"Deus está morto, e nós todos somos seus assassinos."
Osvaldo Giacóia, filósofo contemporâneo.

Obs.: Napalm é um conjunto de líquidos inflamáveis à base de gasolina gelificada, que foi utilizado pelos EUA na Guerra do Vietnã.

10 de out. de 2009

Amor: um broto de vida

Joahnna Wright

Em meio a tantas incertezas, o desejo lhe tomava pelos braços e como quem não tem nada a perder abriu as suas metáforas e encontrou dentro um coração. Nunca pensou que haveria habitantes entre artérias e ventrículos, quando ouviu alguém chamar por seu nome. Pedia um pouco de água e um pouco de luz. A vida daquele coração agora dependia da sua. Coloquei-o então na janela e num piscar de olhos transformei-me numa criança que espiava o mundo do alto de uma grande jabuticabeira.

Bate em paz

Banksy

Nunca soube o que fazer
com os espaços que ficam
depois que alguém vai embora
uma dúvida insiste
e de tanto, o meu tentar desiste
de trocar a ausência
por qualquer coisa que fira menos:
nada para repor
nada para suprir
nada que realmente comportasse
o encanto de algo que ficou
para trás

Cáh Morandi

8 de out. de 2009

7 de out. de 2009

Cego

Cego de nascença, aprendeu a ler no escuro. Desde pequeno os livros lhe eram abertos, os toques lhe fundavam janelas, os sons lhe eram caminhos de pedras. Um dia achou um doador de córnea e pensou que os recursos adquiridos poderiam lhe render a visão total. Não aceitou ser operado por conta do governo, nem enxergar no claro. Ficou com medo de se olhar no espelho das pessoas e ter medo da escuridão que havia nelas.

Silas Correa Leite